A Câmara Municipal de Angra do Heroísmo aceitou o desafio lançado pela Organização das Cidades Património Mundial (OCPM), e realizará uma entrevista por mês a um artesão local. O projeto “Artesanato Local e Poluição Visual” tem como objetivo demonstrar e divulgar as raízes e tradições de todas as cidades que fazem parte da organização, promovendo em simultâneo a arte e o artesão, com o intuito de solidificar a presença destas artes e ofícios tradicionais na comunidade local e dar a conhecer além fronteiras.
Entrevistado: Sr. Braulio Cunha de 40 anos, Telhão, trabalha telha regional e tijoleira.
Câmara Municipal de Angra do Heroísmo (CMAH) Com que idade se envolveu nesta atividade ?
Braulio Cunha (B.C) – Com 14 anos
CMAH– A família teve alguma influência no seu interesse por esta arte ?
B.C Sim teve, comecei com o meu o pai, eram 4 sócios na altura mas depois o meu pai comprou com cerca de 45 anos e ficou à frente do negócio com 3 empregados. Hoje em dia ainda é com gosto que faço a telha, embora tenha cessado a atividade comercial.
CMAH – Os seus filhos/familiares mais novos demonstram o mesmo interesse pela sua area?
B.C Tenho uma filha de 10 aos que as vezes me vem ajudar
CMAH – O artesanato é a sua profissão ou é uma ocupação/fonte de rendimento extra ?
B.C Atualmente tenho outra profissão, de pedreiro e pintor, como esta atividade fechou.
CMAH – Sente dificuldade em captar/despertar o interesse das novas gerações pela sua arte?
B.C Sim, houve alguns contactos efetuados pelas escolas mas espaço neste momento não tem as condições necessárias para se fazer uma visita de estudo às instalações.
CMAH – Classifique a evolução da sua arte nos últimos 20 anos ?
B.C Tem-se alterado um pouco a demanda por parte dos consumidores, atualmente quando me procuram já não é tanto para a telha, mas sim para a tijoleira.
CMAH – Qual a sua maior fonte de rendimento a nível de clientes? Habitantes locais ou turistas ?
B.C A maior fonte de rendimentos eram os habitantes locais, pois os Turistas, passavam e ainda passam, mas só movidos pala curiosidade em ver o produto regional.
CMAH – Como analisa a continuidade e longevidade da sua aréa de artesanato ?
B.C A continuidade a nível de produtividade teria de ser com a produção de tijoleira, pois esta tem mais futuro, no sentido de ser ainda bastante procurada. A nível de produção das telhas, a que vem de fora tem mais qualidade e é mais forte e resistente do que a nossa telha regional, penso por isso que o futuro da telha regional poderá é passar por uma escolha para ser património cultural. Destaco apenas que a telha regional se distingue da telha que vem de fora, no caso dos fornos de cozer pão, pois é uma telha que aguenta e conserva melhor o calor, sendo melhor para os fornos do que as telhas que vem de fora..
CMAH – Qual o fator que mais diferencia a sua arte das outras ?
B.C Talvez o facto do fabrico da telha artesanal estar em vias de extinção.
CMAH – Sente dificuldade em captar/despertar o interesse das novas gerações pela sua arte?
B.C Sim sinto muita dificuldade, pois é um ofício que nos dias de hoje não traz grande rentabilização e retorno a nível financeiro.
CMAH – Se tivesse que expor o seu trabalho em algum país europeu, qual escolheria? Porquê?
B.C Nunca fui contactado para isso, no entanto já vendi tijolos para as outras ilhas.
CMAH – Na sua opinião, como classifica os apoios dados ao artesanato?
B.C Já procurei apoio ou ajuda mas a resposta que tem é que para ser apoiado, apenas serei em apenas metade da recuperação da minha oficina, o que torna assim difícil a recuperação da mesma.
CMAH – Tem se falando muito na modernização dos processos de artesanato, concorda? Porquê?
B.C No meu caso prejudicou muito o meu trabalho, pois é mais fácil e rápido. Para se ter uma ideia eu para fazer 10000 telhas levaria 3 meses a fazer sozinho.
CMAH – Qual foi o momento mais feliz/marcante da sua carreira, o mais difícil e mais engraçado ?
B.C Os momentos que me marcaram estão todos relacionados com o ensinamento que tive com o meu pai, que com 85 anos ainda gosta de vir aqui ver as suas coisas. O meu pai ficou sozinho quando eu fui para a tropa e os empregados não davam rendimento por isso nesta altura foi mais complicado. Nos anos 90 o negócio foi bom, vendíamos cerca de 40000 telhas em 4 a 5 meses, para a Ediçor, que retelhava igrejas e fazia recuperações de casas.